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Opinião: Vermelho como o Sangue, de Salla Simukka

 
Vermelho como o Sangue
de Salla Simukka 

Edição/reimpressão: 2015
Páginas: 216
Editora: Editorial Presença 




 Resumo: 
Lumikki Andersson tem 17 anos e vive sozinha num pequeno apartamento, na cidade onde frequenta uma prestigiada escola de Artes. Lumikki é solitária, independente, e gosta da liberdade. Na escola prefere dedicar-se aos estudos e ignorar os grupinhos que se vão formando. Não se meter naquilo que não lhe diz respeito é, para ela, uma regra fundamental. Mas essa regra vai ser posta à prova no dia em que encontra uma incrível quantidade de notas de quinhentos euros penduradas a secar no laboratório fotográfico da escola e que tudo indica terem estado manchadas de sangue. Em poucas horas, Lumikki, juntamente com três dos seus colegas, vê-se enredada numa sombria conspiração.

— Quem me dera ter um filho branco como a neve, vermelho como o sangue e escuro como o ébano!

Rating: 4/5
Opinião: Para não variar, gosto de mais uma capa dos livros editados pela Editorial Presença. Sendo raras as vezes em que não me apego ou lhes atribuo significado, "Vermelho como o Sangue" volta a confirmar mais uma decisão editorial acertada com o poder de atrair a atenção do leitor (sim, nós sabemos: o conteúdo não está dependente das capas, e nem julgamos um livro por razões semelhantes, mas no meio de uma livraria cheia, uma capa de cativar o olho é vencedora). Remetendo para algo sombrio mas simultaneamente sedutor, a cativação entre sinopse e atração ligeiramente obscura são predominantes. No entanto, e após terminar esta leitura, pergunto-me se não induzirá um pouco em erro quem tenha expectativas elevadas quanto ao conceito.
Certamente que já vos aconteceu em alguns casos, pelo que não será estranho afirmar que alguns livros têm o poder de nos confundir completamente. Este livro foi sem dúvida um desses casos que, durante a sua leitura e enquanto expectadora, me fizeram sentir posicionada sob diversas ópticas, tendo uma análise diferente do livro a cada momento.
Numa primeira instância remeti alguma dessa sensação para o género literário. Nunca li nada do noir nórdico, embora esteja a tentar convencer-me a enveredar por alguns (até guardei a lista que a Vera d' A Menina dos Policiais compilou em tempos para saber por onde começar nessa aventura misteriosa). Fiquei portanto curiosa come este livro que, ainda que enquadrado nessa categoria, seria certamente um registo ligeiramente mais leve, atendendo ao facto de tratar-se de um livro direccionado para o público jovem-adulto. As minhas expectativas iniciais passavam por imaginar um enredo que eventualmente apresentasse menos descrições gráficas ou pormenores macabros em destaque, mas que ainda assim abordasse os preâmbulos do perigo e do cinzento típico da paisagem invernosa dos países nórdicos. Não obstante o facto ter elementos incomuns num romance tipicamente YA, com uma presença menos emocional e mais orientada para uma composição factual, ainda que sempre impulsionada pela acção, acho que aguardava por uma presença mais acentuada de "negritude". Fala-se em contrastes, em cores, na versatilidade do branco e do vermelho, da neve e da noite, mas sem um certo impacto quanto ao crime principal. Ele existe, está lá e não é escondido, mas também não é de todo o enfoque da estória.
Ao longo de todo o livro, é possível registar a presença de pequenos elementos que atestam a nacionalidade da autora (as constantes descrições de nevões e de aspectos climáticos reforçam essa imagem, assim como alusões a pequenos elementos culturais, como figuras públicas ou bens alimentares tradicionais ou de regular consumo). No entanto, não existe uma grande interação imediata com o meio envolvente que nos diga se facto estamos no país natal de Lumikki ou noutro país qualquer. Talvez essa orientações fugas tenha sido propositada, de forma a que atenção ficasse concentrada na dinâmica resultante desde o cair da primeira peça.
Por esse motivo, a estória acabou por revelar-se ligeiramente menos densa que as minhas expectativas iniciais tinham programado, mas ainda assim com capacidade de entretenimento. De facto, existe uma rede de oferta garantida com crimes, perseguições, algum mistério e homens densos e perigosos. As teorias começaram a formar-se e aguardavam um desenvolvimento não muito demorado. Esperava-se também uma rede intrincada de mistério de difícil resolução ou que nos fizesse..enfim..temer pelas personagens! No entanto, e com a excepção da Lumikki que toma o livro todo para si, as outras personagens surgiram um pouco apagadas mesmo quando detinham a palavra nos breves acompanhamentos na primeira pessoa de personagens secundárias. Estes pontos de vista poderiam eventualmente ter sido mais explorados, até porque quando se tornavam de facto interessantes, eram meio que cortados pela autora para a linha inicial de raciocínio.
Lumikki é então o livro por inteiro, ocupando cada página, mesmo quando não está presente. Com uma estória familiar e de infância por contar, a sua posição peculiar perante o mundo e a sociedade envolvente não é despropositada de todo, e deixa a vontade de descobrir mais. Gostei que ela não fosse a típica heroína mas também não sendo um elemento totalmente contrário. Com desenvoltura e surpreendente, sabe ser intrigante e gerar reacções involuntárias, mas por vezes também transparentes que nos deixam espreitam um pouco a sua essência.
Ainda assim, a leituras primeiras 50 páginas do livro, onde Lumikki é o quase que o único elemento em evidência, passaram sem que conseguisse reter muito conteúdo. Não porque não estivesse com atenção, mas porque a estrutura está criada para que, consoante os desejos desta personagem para o mundo em seu redor, esta passasse despercebida, como se diante encontros numa rua e mesmo que perante uma observação mais atenta, a nossa capacidade de a descrever seria nula.
Com o avançar do livro, e atendendo também ao facto de o eu desejo de ser/ estar camuflada ir decrescendo consoante as circunstâncias necessárias, a personagem acabou por ir ganhando destaque, despertando curiosidade, e criando espaço e memória na minha mente. Atingindo vários estereótipos ao mesmo tempo que os quebra, com respostas mordazes mas repletas de ironia de quem tem um bom coração mas tenta escondê-lo, acompanhar as peripécias a que ela tanto quis fugir com uma pitada de humor e muito desconcerto, não foi nada difícil. Especialmente porque esta rapariga cheia de vida traz-nos uma verdadeira adolescente, com alguma crueza na forma de pensar (mas muito real no seu raciocínio),com anseios, dúvidas, medos e estórias passadas, mas também desafios, ambições e originalidade.
Por causa dela, o enredo meio esmorecido acabou por não ser assim tão importante, por muito que no entanto desejasse uma maior evidência da importância deste elemento quase que descartável.  Gostava no entanto que o Urso Polar voltasse às páginas da trilogia e que a sua introdução não fosse um mero truque de mágica.
Por fim, deixo alguns apontamentos a ter em conta atendendo ao estilo da autora e a opções de escolha editorial: por vezes surgiram diálogos em inglês sem tradução, o que para quem não souber compreender a língua é aborrecido (e ter-se-ia facilmente resolvido com uma nota de tradutor em rodapé, à semelhança de outras existentes no livro). Há que não esquecer que ainda que faça parte do programa curricular, o Inglês não é ainda perfeitamente compreendido por todos os jovens nas idades compreendidas ao que se espera que se seja o público-alvo de "Vermelho como Sangue". 
Por outro lado, desconheço qual a sonoridade do finlandês quando falado, mas do pouco que julgo conhecer, reconheço palavras de grande extensão e difícil expressão, com um significado mais ou menos complexo. Calculo que por esse motivo, e sem nunca ter aberto a edição original, tendi a acreditar que na versão original existem diversas frases curtas (especialmente ao início da obra) que por questões de sonorização e linguísticas soariam melhor dessa forma. No entanto, e ao tratar-se de facto de um motivo derivado de processos linguísticos, este perde-se na tradução. Por conseguinte, terem adoptado frases mais curtas ou com paragens um pouco momentâneas (abruptas, que me fizeram ler um pouco embalada em soluços) acabou por não resultar da melhor forma para mim. Cortaram-me a linha de raciocino algumas vezes e tornaram-se um quanto aborrecidas. 
Ainda assim, foi um livro que me surpreendeu e marcou mais do que o que esperado. Talvez se deva a uma magia muito própria, sem dúvida, pelo que o meu seguro 3 de rating transformou-se depressa num 4 mal encerrei o livro. Pela sua originalidade, pela surpresa de que um livro meio apagado nos cenários transversais pode causas e porque, no fim de contas, me fez contente"

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Cláudia
Sobre a autora:
 
Maratonista de bibliotecas, a Cláudia lê nos transportes públicos enquanto observa o Mundo pelo canto do olho. Defensora da sustentabilidade e do voluntariado, é tão fácil encontrá-la envolvida num novo projeto como a tagarelar sobre tudo e mais alguma coisa. É uma sonhadora e gosta de boas histórias, procurando-as em cada experiência que vive.

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